Não, você não leu errado. Há dois insetos que levam nomes de dois dos maiores ditadores da História. Por isso, o besouro Hitler e a borboleta Mussolini vêm provocando debates na comunidade científica.
Em setembro do ano passado, o ornitologista e taxonomista Marcos Raposo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), publicou um editorial no periódico científico Zoological Journal of the Linnean Society. No texto, discute o dilema entre homenagear colonialistas imperiais ou promover a justiça histórica ao nomear as espécies.
Raposo responde a uma decisão da Comissão Internacional da Nomenclatura Zoológica (ICZN), que arbitra sobre o uso correto dos nomes científicos de espécies animais. Em janeiro do mesmo ano, a ICZN decidiu que não mudaria nomes de espécies que sejam considerados ofensivos.
Segundo os argumentos, isso abriria um precedente que possa dificultar a identificação e categorização da fauna global. Ao que, a princípio, o cientista discorda. Segundo ele, nomes científicos de espécies são uma forma de perpetuar a memória de pessoas e eventos históricos.
Então, quando homenageiam, por exemplo, colonialistas imperiais, isso significa perpetuar a memória de um passado de violência e opressão.
Leia mais: Passaportes mais poderosos do mundo: veja a posição do Brasil
O caso do besouro Hitler
De modo geral, nomes científicos de espécies animais têm duas partes. Primeiro, o gênero, em maiúsculo, descreve o agrupamento de diversas espécies ao qual o animal (ou planta) pertence. Em seguida, o epíteto em minúsculo é mais específico à espécie. Ademais, para seus descobridores, é também potencialmente mais individual.
Acontece que alguns nomes científicos de espécies animais homenageiam figuras históricas controversas. O besouro Hitler, por exemplo, descoberto em 1937, cujo nome científico é Anophthalmus hitleri.
O nome foi dado pelo entomologista alemão Oskar Scheibel, um admirador de Adolf Hitler. Da mesma forma, a borboleta Hypopta mussolinii, encontrada na Líbia em 1927. Como se vê, foi nomeada em homenagem ao líder fascista italiano Benito Mussolini.
Temos, ainda, o coral Catalaphyllia jardinei, que integra o Grande Recife de Corais na Austrália. A princípio, o nome é uma homenagem ao colonialista Frank Jardine, responsável pelo deslocamento violento da população aborígene na região norte de Queensland.
De acordo com Raposo, nomes desse tipo devem mudar, pois são ofensivos para as comunidades afetadas pelo colonialismo e pela escravidão. Deste modo, perpetuam a memória de um passado de violência e opressão. Consequentemente, podem causar dor e ressentimento.
Leia mais: 8 países para você estudar de graça na Europa, ou por quase nada
Limites da ética
Mas, diante de nomes como do besouro Hitler, há limites para nomear espécies? Conforme o código de ética que governa a taxonomia, os cientistas devem evitar, com base em seu “conhecimento ou crença razoável”, nomes que possam ofender.
No entanto, ICZN decidiu que não mudaria estes nomes. E, para Raposo, não há razão para acreditar que uma mudança requisitada em termos éticos (reparação histórica) ameace a estabilidade.
Raposo, contudo, não é o único a discordar da decisão. Na mesma época, outros pesquisadores publicaram respostas à ICZN. Conforme apontam, ela mostraria mais tradições do que, propriamente, rigores éticos.
E tem outro Hitler por aí!
Embora haja tanta discussão científica, o besouro Hitler tem mais um companheiro de nome. Na Índia, um percevejo fedorento arrasa plantações e, ainda, solta um odor característico para afastar predadores.
O nome, Hitler Bug, ou inseto de Hitler, vem das características do bichinho. A princípio, o inseto tem marcas pretas nas costas e corpo laranja. Porém, se visto de cabeça para baixo, suas manchas lembram o rosto do ditador.
E aí, o que acha dos nomes do besouro Hitler e demais insetos? Também concorda que deveriam mudar?
0 comentários